Medicina - Estado da arte # 02 - Corpo físico e 'the physician'
Tudo começou, como muitas das boas reflexões, numa manhã qualquer, com uma mensagem num grupo do conversas1. Trazia um daqueles questionamentos inusitados:
“Josyk: Amigos, acordei com uma questão filosófica na cabeça... Para aplicar o conhecimento em muitas áreas da ciência, embora atitude rival da incerteza, nós precisamos assumir que algumas coisas são necessariamente verdade. Se você quiser voar, precisa assumir que as Leis de Newton são verdadeiras... na medicina, há algum equivalente epistemológico para lei / teoria?”
A pergunta toca no cerne da prática médica: em que terreno pisamos? Se um engenheiro se apoia nas leis da física, e um biólogo na teoria da evolução, sobre quais pilares inabaláveis um médico constrói sua decisão à beira de um leito?
Minha resposta: de forma simples, é tudo física. As disciplinas que estudamos — química, biologia, fisiologia, medicina — são investigações de propriedades emergentes que se manifestam em diferentes escalas de complexidade. Eu diria que a medicina está para a fisiologia/fisiopatolgia assim como a engenharia hidraulica está para a mecanica de fluidos. A maioria dos padrões universais com que lidamos sao emprestados da fisiologia, anatomia, quimica, etc...
Essa linha de pensamento nos leva a uma curiosidade etimológica fascinante. A palavra física vem do grego physis (φύσις), que significa simplesmente "natureza". O physicist (físico, em inglês) é o estudioso das leis fundamentais da natureza. Mas e o physician (médico)? A raiz é a mesma. O physician é, em sua origem, um estudioso da natureza, especificamente da natureza do corpo humano.
Lembro da polêmica quando o livro de Noah Gordon, "The Physician", foi traduzido no Brasil como "O Físico". Muitos torceram o nariz, mas a tradução, embora incomum, capturava uma verdade ancestral: o médico, em sua essência, era o mestre do mundo físico, material, do corpo. Ele estudava as doenças "físicas".
Mas seria a medicina apenas uma ciência aplicada? Uma arte que se limita a usar as descobertas de outras áreas? Não. Existem algumas abstrações especificas sobre o processo de doença e outros aspectos do cuidado em súde por si.
A medicina se apoia com total confiança nas ciências fundamentais — suas "leis" são as verdades da biologia e da química. Ao mesmo tempo, para dar sentido ao processo de adoecer e curar, ela precisou criar suas próprias grandes abstrações: a homeostase, a resposta inflamatória, o conceito de neoplasia, o modelo de infecções2 .
Então, respondendo à pergunta da Josyk: não, a medicina talvez não tenha "leis" no sentido newtoniano. O que ela tem é algo talvez mais complexo e belo: uma base sólida de ciência fundamental sobre a qual construiu seu próprio e sofisticado andaime de teorias e abstrações para interpretar a natureza — a physis — do corpo humano.
Talvez a grande "lei" da medicina seja justamente essa: uma conversa entre os princípios universais da natureza e a extraordinária complexidade que emerge quando essa mesma natureza se torna consciente e passa a cuidar de si.
O grupo “do Josyk” reúne profissionais de saúde, pesquisadores e divulgadores ligados à prática baseada em evidências.
Felipe Nogueira, um outro amigo do grupo citou a teoria microbiana das doenças , que seria um exemplo de uma grande abstração própria da medicina